quinta-feira, 20 de agosto de 2009

fantasmas pela ópera

De dia, sentia frio. De noite, o jantar não era outro que não indigesto e, ao dormir, não sonhava. Fui à ópera e intervim. Ouviram-me um canto fluido. Achei, no teatro lírico, uma alma para mim. Por tudo o que fiz, desejaram-me. Convencido ou esquecido, atirei as migalhas mais dignas que pude tirar dos bolsos daquela alma. Em cena, fingia não ter frio quando, olhando-me nos olhos, só podiam aplaudir o espetáculo e aprovar o drama. Época essa a de artista talvez agradável de recordar: a rua fazia menos frio e, em casa, vez ou outra, tinha pesadelos. Fui substituído. Então que eu via peripécia onde eles viam aventura, decidi deixar o que em mim sobrava daquela alma num beco. Um pouco mais de coragem para aquela carreira e força para recobrar ou dominar a fluidez dos primeiros cantos, ainda teria uma espiritualidade resolvida.


Il suffit d'un peu d'imagination pour sentir alors ce que signifie un destin d'acteur. C'est dans le temps qu'il compose et énumère ses personnages. C'est dans le temps aussi qu'il apprend à les dominer. Plus il a vécu de vies différentes et mieux il se sépare d'elles. Le temps vient où il faut mourir à la scène et au monde. Ce qu'il a vécu est en face de lui. Il voit clair. Il sent ce que cette aventure a de déchirant et d'irremplaçable. Il sait et peut maintenant mourir. Il y a des maisons de retraite pour vieux comédiens.
Camus - Le Mythe de Sisyphe

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